No decorrer do tumultuado período das Guerras Napoleônicas, que se estendeu de 1803 a 1815, a Europa viu-se envolvida em uma intensa escalada de hostilidades.
No entanto, no rescaldo desses conflitos marcados por derramamento de sangue, emergiu uma narrativa insólita nas paragens da costa nordeste da Inglaterra — uma narrativa que oferece consideráveis insights acerca da profunda animosidade entre duas nações. Neste contexto, deparamo-nos com a intrigante crônica do macaco de Hartlepool.
A Grã-Bretanha deparou-se com a formidável perspectiva de um confronto com a França, impulsionado pelo insaciável desejo de expansão territorial por parte de Napoleão, aliado a seu anseio por perpetrar um assalto anfíbio contra o histórico adversário francês.
No cerne do temor a uma potencial invasão, a nação britânica defrontou-se com o desafio de financiar a fortificação de suas defesas costeiras, em meio à iminência de uma crise econômica latente.
Os franceses, alvo de desdém, foram amplamente submetidos a zombarias no âmbito de uma guerra propagandística, na qual Napoleão era frequentemente caricaturado como um beligerante de estatura reduzida, por vezes mesmo associado a uma figura simiesca.
"Os habitantes de Hartlepool passaram a cultuar uma peculiar lenda urbana. A tradição local sustenta que, quando se avistou um navio francês em situação precária, os moradores da localidade mantiveram vigilância a fim de assegurar que nenhum sobrevivente restasse. Durante a inspeção dos destroços, depararam-se com um único sobrevivente — um macaco trajando um distintivo uniforme francês.
Face à presença do macaco (presumivelmente de origem francesa), o primata foi submetido a acusações de espionagem em um raro julgamento contemporâneo envolvendo um animal.
Com sentença de morte decretada, o macaco de Hartlepool foi submetido ao enforcamento em uma estrutura erguida a partir dos destroços da embarcação.
Esta narrativa assumiu um papel fundamental na configuração da identidade dos habitantes de Hartlepool, refletindo-se em aspectos tangíveis, como a adoção do apelido “Monkeyhangers” para a equipe local de rugby e a designação do mascote da equipe de futebol como o macaco H’angus.
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Ademais, ela exerceu influência na criação de obras literárias e na instauração de uma estátua de macaco no porto, cuja presença exerce um atrativo turístico notável.
Contudo, cumpre questionar a legitimidade dessa narrativa à luz dos fatos históricos. A premissa de que pescadores seriam incapazes de discernir entre um macaco e um ser humano, independentemente de serem franceses ou ingleses, demonstra um grau de inverossimilhança substancial.
Dentre as interpretações aventadas, destaca-se a sugestão de que o termo “macaco de Hartlepool” possivelmente alude a um “macaco de pólvora”, denominação atribuída a jovens incumbidos de abastecer canhões com pólvora.
Entretanto, mesmo considerando os registros meticulosos de naufrágios marítimos, o Historic UK não logrou encontrar indícios de naufrágios de embarcações francesas na localidade durante o período das Guerras Napoleônicas.
A hipótese mais provável é que o mito do macaco de Hartlepool tenha tido sua origem no imaginário de Ned Corvan, um ícone dos music halls, que produziu a primeira menção documentada dessa história em uma canção datada dos anos 1850.
A similitude entre essa narrativa e uma canção similar dos anos 1770 do nordeste da Escócia — intitulada “Boddamers Hung the Monkey-O” — sugere que contos e canções que satirizavam os franceses e incorporavam a figura do macaco eram elementos em voga na época.
É pertinente questionar se essas narrativas contribuíram para fomentar um sentimento antifranco na região. Durante o referendo do Brexit em 2016, a BBC News divulgou que setenta por cento dos habitantes de Hartlepool endossaram a decisão de sair da União Europeia.
Em resposta a esse contexto, os produtores de uma peça teatral de 2017, baseada nessa narrativa, alegaram que “o Macaco de Hartlepool é uma produção atual que aborda a irracionalidade da xenofobia”, conforme relatado pelo jornal The Telegraph.