Atrasos na missão VERITAS da NASA prejudicam a exploração de Vênus. Saiba como isso afeta a pesquisa científica e as próximas missões espaciais.
Três missões aguardadas com grande expectativa para explorar Vênus haviam sido cuidadosamente programadas para ocorrer em sincronia, mas infelizmente, tal planejamento não se concretizou.
O adiamento da primeira das três missões planejadas para explorar o abrasador planeta Vênus, é um fator preocupante para a comunidade científica. Há décadas, os especialistas clamam pela presença de mais sondas robóticas naquele planeta, e a chegada dessas missões poderia trazer importantes avanços para a exploração espacial.
No final do ano passado, a NASA anunciou o adiamento da missão VERITAS (ou Venus Emissivity, Radio Science, InSAR, Topography and Spectroscopy), inicialmente prevista para decolar em 2027 e inaugurar a tão aguardada “Década de Vênus”.
Entretanto, a recente proposta orçamentária da Casa Branca para a NASA, divulgada em março de 2023, destinou apenas US$ 1,5 milhão por ano para financiar a missão VERITAS no futuro próximo, resultando em um “congelamento profundo” para o projeto.
"Com a maior parte dos recursos destinados a outras missões com custos excessivos, grande parte do trabalho na missão VERITAS foi interrompida, culminando em um atraso indefinido que levou ao desmantelamento da equipe de engenharia da missão. Tal cenário desperta preocupação entre os cientistas envolvidos com a exploração de Vênus, que temem que o atraso da missão VERITAS possa impactar negativamente outras duas missões planejadas para o planeta vizinho.
“Existe uma sinergia notável entre a missão VERITAS e outras empreitadas”, declarou Stephen Kane, astrônomo da Universidade da Califórnia em Riverside, em entrevista ao portal Space.com.
A missão VERITAS tinha o intuito de se tornar a primeira em quase 30 anos a retornar a Vênus, desde a histórica órbita realizada pela espaçonave Magellan da NASA. Segundo Darby Dyar, vice-investigador principal da missão, em entrevista ao portal Space.com, a espaçonave seria responsável por coletar medições fundamentais necessárias para diversos tipos de pesquisas científicas acerca de Vênus.
Dentre as medições coletadas pela VERITAS, destaca-se o mapeamento da superfície de Vênus com resolução de pelo menos três vezes superior à obtida pela sonda Magalhães. Tais dados seriam de grande valia para a DAVINCI (ou Deep Atmosphere Venus Investigation of Noble Gases, Chemistry, and Imaging), outra missão da NASA direcionada a Vênus.
Com previsão de chegada a Vênus no início da década de 2030, a missão DAVINCI (ou Deep Atmosphere Venus Investigation of Noble Gases, Chemistry, and Imaging) planeja lançar uma sonda através das densas nuvens do planeta para alcançar a sua superfície.
O plano original previa que a VERITAS já teria chegado a Vênus antes do lançamento da DAVINCI, permitindo aos cientistas a utilização de seus dados para a seleção do melhor local de pouso para a sonda. “O mapeamento da superfície fornecido pela VERITAS teria sido de grande utilidade para a implantação do DAVINCI”, explicou Kane ao Space.com.
Outra missão que estava planejada para aproveitar os dados coletados pela VERITAS é a EnVision, liderada pela Agência Espacial Europeia (ESA) e prevista para ser lançada no início da década de 2030, com o objetivo de estudar o clima de Vênus. No entanto, agora, a EnVision está programada para visitar o planeta ao mesmo tempo em que a VERITAS, que sofreu atrasos devido a problemas de orçamento da NASA, chegará – se é que vai chegar.
Este cenário é “menos do que ideal, já que a equipe da EnVision esperava ter os dados da VERITAS em mãos”, afirmou Paul Byrne, professor de astronomia da Universidade de Washington em St. Louis, Missouri, em entrevista ao Space.com.
A simultaneidade das missões também implica na necessidade de construir instrumentos idênticos para ambas. Por exemplo, o Centro Aeroespacial Alemão (DLR) é responsável pela construção do Venus Emissivity Mapper (VEM) para a VERITAS e do VenSpec-M para a EnVision. Ambos os instrumentos deveriam complementar-se na análise da superfície de Vênus, de modo que o DLR havia planejado construir primeiro o instrumento VERITAS e, em seguida, o da EnVision.
“No entanto, com o cenário atual, a equipe DLR pode acabar construindo simultaneamente duas cópias do conjunto de instrumentos”, disse Byrne, professor de astronomia da Universidade de Washington em St. Louis, Missouri, ao Space.com. “Isso irá colocá-los sob pressão de tempo e de recursos humanos.”
Os pesquisadores estão apreensivos com a possibilidade de ter o VERITAS e o EnVision em Vênus simultaneamente, o que pode resultar em resultados menos do que ideais para parte da ciência esperada, incluindo a detecção de vulcões venusianos dentro de prazos mais curtos do que o desejado.
Ambas as missões têm instrumentos de mapeamento VEM e VenSpec-M que buscam por fluxos de lava ativos na superfície do planeta, o que pode fornecer evidências robustas de atividade vulcânica ainda presente. Essas descobertas se juntariam à recente descoberta de um vulcão ativo em Vênus, feita enquanto analisavam dados coletados pela nave Magellan da NASA ao longo de três décadas.
Foi possível fazer uma descoberta incrível graças ao registro de duas imagens com oito meses de intervalo que mostraram que uma abertura vulcânica havia crescido visivelmente e mudado de forma, sinalizando atividade vulcânica recente.
Os cientistas esperam encontrar mudanças semelhantes nas próximas missões e, por essa razão, a chegada do VERITAS e do EnVision foi escalonada no início para que seus dados se complementassem. No entanto, com o atraso, a separação entre as duas missões foi reduzida, o que pode prejudicar a qualidade dos resultados. Ainda assim, os cientistas são otimistas e acreditam que a menor separação permitirá detectar com mais rapidez as mudanças e atividades vulcânicas.
Embora a equipe de engenharia da VERITAS esteja temporariamente impedida de continuar com seus trabalhos, a equipe científica ainda conta com um financiamento limitado de US$ 1,5 milhão por ano e está empenhada em avançar nos preparativos para a missão. Além disso, estão sendo consideradas alternativas para adiantar a data de lançamento, de forma a garantir o sucesso da empreitada antes de 2031.