O Genoma, também conhecido como o “Livro da Vida”, é uma estrutura notavelmente extensa.
Independentemente do organismo em questão, como as bactérias, por exemplo, a Escherichia coli, que apresenta 4,6 milhões de pares de bases, ou o peixe pulmonado australiano, com um notável número de 43 bilhões de pares de bases (14 vezes maior do que o genoma humano), é evidente que o número de instruções genéticas é determinante para as características e funções de um organismo vivo.
No entanto, surge a seguinte indagação: seria realmente necessário que os genomas fossem tão extensos? Observa-se que a natureza é conhecida por incorporar mecanismos de redundância com o intuito de auxiliar os organismos a enfrentarem o estresse ambiental e compensar mutações prejudiciais.
Nesse sentido, é válido questionar o que ocorreria se um genoma fosse reduzido apenas aos seus genes essenciais mais básicos.
Surpreendentemente, descobriu-se que a vida seria capaz de encontrar formas de sobreviver e prosperar, mesmo lidando com uma quantidade reduzida de informações genéticas.
"Nesse contexto, é notável que os organismos possuem uma notável capacidade de adaptação e evolução, superando as limitações impostas pela redução do conjunto de informações genéticas.
Em um estudo recente publicado na revista Nature, uma equipe liderada pela Universidade de Indiana e pelo Instituto J. Craig Venter realizou uma conquista significativa ao criar uma “célula mínima” a partir da bactéria Mycoplasma mycoides.
Esta célula, caracterizada por conter apenas cerca de 493 genes, possui o menor genoma já registrado em qualquer organismo de vida livre conhecido.
O experimento revelou que essas células mínimas apresentaram a notável capacidade de evoluir e se multiplicar, demonstrando a recuperação da aptidão genética que havia sido perdida devido à redução de seus genomas.
“Parece haver algo extremamente robusto na vida”, afirmou Jay T. Lennon, autor sênior do estudo e professor de biologia na Universidade de Indiana Bloomington, em um comunicado à imprensa. “Podemos simplificá-la ao máximo, reduzindo-a apenas ao essencial, mas isso não impede a evolução de entrar em ação.”
Mycoplasma mycoides é uma bactéria patogênica associada à pleuropneumonia bovina contagiosa, uma doença respiratória prevalente em ruminantes, como bovinos e caprinos. Esta bactéria coloniza os tratos intestinais desses animais.
Em um estudo realizado em 2016, pesquisadores do renomado Instituto J. Craig Venter promoveram uma redução significativa no genoma de M. mycoides, reduzindo-o de 901 genes para 493 genes.
Esse processo resultou na criação de uma nova linhagem sintética da bactéria, denominada JCVI-syn3B. Tal conquista científica trouxe importantes avanços no estudo desta bactéria e suas interações com os hospedeiros ruminantes.

No novo estudo, Lennon e seus colegas buscaram investigar a resposta da célula mínima quando submetida a um ambiente de laboratório desfavorável.
Conscientes da propensão das bactérias à multiplicação celular, eles questionaram se as células mínimas, com seu genoma simplificado, ainda precisariam passar por mutações.
Caso fosse necessário, indagaram se essas mutações trariam benefícios ou prejuízos para a capacidade de sobrevivência da bactéria geneticamente modificada.
“Todos os genes presentes no genoma de M. mycoides JCVI-syn3B são essenciais”, afirmou Lennon. “Poderíamos especular que não há margem para mutações, o que poderia limitar seu potencial de evolução.”
Os pesquisadores identificaram que, mesmo com um genoma extremamente simplificado, M. mycoides apresentou uma taxa de mutação excepcionalmente alta durante os 300 dias em que foi permitido crescer livremente no ambiente laboratorial, equivalente a 40.000 anos de evolução humana.
Quando essas células mínimas foram colocadas em tubos de ensaio contendo recursos nutricionais limitados, simulando um ambiente hostil, em conjunto com outra linhagem de células mínimas que não tiveram o mesmo período de crescimento de 300 dias, e com M. mycoides convencional, cujos genomas não foram modificados, observou-se que as células mínimas obtiveram o segundo lugar.
Foi evidenciado que a vantagem de sobrevivência das células mínimas estava associada aos 300 dias de adaptação, nos quais os cientistas constataram que a bactéria foi capaz de recuperar 50% da queda em sua aptidão que ocorreu inicialmente devido à simplificação do genoma.
Além disso, essas células mínimas evoluíram 39% mais rapidamente do que suas contrapartes não modificadas.
Embora os detalhes precisos de como essas mutações melhoram a aptidão das células mínimas ainda não estejam totalmente esclarecidos, espera-se que este estudo, juntamente com pesquisas semelhantes, contribua para um melhor entendimento do projeto bem-sucedido de células sintéticas, abrindo possibilidades para o surgimento de uma era de vida sintética.