Pesquisadores revelam um novo algoritmo de IA que promete desfocar imagens do cosmos, melhorando a qualidade das imagens astronômicas.
Embora seja de vital importância para a existência da humanidade na Terra, a atmosfera planetária representa uma grande dificuldade para os astrônomos que buscam compreender o que há além dos limites terrestres. Dessa forma, a realização de estudos do cosmos torna-se mais complexa em decorrência da interferência atmosférica. Com o objetivo de contornar esse problema, pesquisadores da Northwestern University, em Chicago, e da Tsinghua University, em Pequim, apresentaram uma nova abordagem baseada em inteligência artificial para aprimorar a qualidade de imagens capturadas por telescópios terrestres.
A principal causa da falta de nitidez em imagens astronômicas é atribuída aos bolsões de ar presentes na atmosfera terrestre. Esses bolsões são capazes de distorcer as formas dos corpos celestes e também influenciar as medições realizadas pelos cientistas de objetos distantes, o que pode levar a conclusões equivocadas.
Para evitar tais problemas, os telescópios que operam no espaço, como o Hubble e o Telescópio Espacial James Webb, são empregados, uma vez que esses equipamentos não sofrem interferência atmosférica. Entretanto, a utilização desses telescópios é extremamente dispendiosa e também possui alta demanda por parte da comunidade astronômica.
A construção de telescópios terrestres é uma opção mais viável, acessível e simples de ser reparada em caso de problemas técnicos. Todavia, o desfoque atmosférico ainda representa um desafio a ser enfrentado pelos astrônomos que utilizam esses equipamentos. Com o intuito de minimizar a interferência atmosférica, os telescópios terrestres são instalados em locais de clima árido e em grandes altitudes. No entanto, medidas adicionais devem ser empregadas para aprimorar a nitidez das imagens obtidas.
"A luz proveniente de estrelas distantes, planetas e galáxias percorre uma longa trajetória até chegar à Terra. Durante essa jornada, a luz pode sofrer diferentes efeitos gravitacionais que distorcem a imagem observada a partir da Terra. Além disso, a luz também deve atravessar a atmosfera terrestre antes de ser captada pelos telescópios terrestres.
De acordo com a Northwestern, mesmo em céus noturnos límpidos, o ar em movimento presente na atmosfera interfere na passagem da luz. Essa interferência é responsável pelo fenômeno de brilho das estrelas e é um dos motivos pelos quais os melhores telescópios terrestres são instalados em locais de grande altitude, onde a atmosfera é mais rarefeita.
Alexander explica que esse efeito é semelhante a olhar para cima do fundo de uma piscina, embora a atmosfera seja muito menos densa do que a água.
O desfoque gerado pela atmosfera da Terra representa um problema significativo para os astrofísicos que analisam imagens para obter dados cosmológicos importantes. A forma aparente das galáxias é capaz de fornecer informações sobre as estruturas cosmológicas de grande escala e seus efeitos gravitacionais.
Segundo Alexander, pequenas diferenças na forma das galáxias podem oferecer pistas sobre a gravidade no universo. No entanto, a distorção da forma das galáxias em imagens capturadas por telescópios terrestres pode dificultar a identificação de efeitos gravitacionais ou atmosféricos.
Quando uma imagem apresenta borramento, torna-se difícil obter conclusões precisas sobre a forma do objeto observado. A eliminação precisa e matemática do desfoque possibilita a medição e análise da verdadeira natureza de objetos distantes.
Os pesquisadores utilizam diversas técnicas baseadas em software para processar imagens astronômicas, com o objetivo de torná-las mais nítidas e úteis. Contudo, uma nova abordagem de visão computacional, apresentada pela primeira vez na Space, promete resultados ainda melhores e mais rápidos. Esse algoritmo foi desenvolvido especificamente para o processamento de imagens astronômicas capturadas por telescópios terrestres, o que representa a primeira vez que uma tecnologia de inteligência artificial é utilizada para essa finalidade.
A equipe realizou o treinamento do algoritmo de IA em dados simulados para se adequar ao Observatório Vera C. Rubin, que está programado para inaugurar no próximo ano no Chile e abrigará a maior câmera digital do mundo. O novo algoritmo será compatível com o observatório assim que estiver pronto para operação, proporcionando uma atualização notável ao telescópio antes mesmo do início de suas observações estelares.
“O objetivo da fotografia geralmente é obter uma imagem esteticamente agradável”, afirma Emma Alexander, autora sênior do estudo da Universidade Northwestern. “Contudo, as imagens astronômicas são utilizadas para fins científicos. A remoção adequada do desfoque permite a obtenção de dados mais precisos. O algoritmo remove computacionalmente os efeitos da atmosfera, possibilitando aos físicos a realização de medições científicas mais precisas. Como consequência, as imagens finais também apresentam uma maior qualidade estética.”
Emma Alexander é uma professora assistente de ciência da computação na McCormick School of Engineering da Northwestern University, onde lidera o Bio Inspired Vision Lab. O novo estudo foi coautoria de Tianao Li, estudante de graduação em engenharia elétrica na Universidade de Tsinghua e estagiário de pesquisa no laboratório de Alexander.
A equipe desenvolveu um algoritmo de otimização baseado em uma rede de aprendizado profundo treinada em imagens astronômicas, o qual produz imagens com 38,6% menos erros na remoção do desfoque em comparação aos métodos clássicos e 7,4% menos erros em relação aos métodos modernos. Embora pareça uma melhoria sutil, esse resultado é significativo no contexto da astronomia. Pequenas melhorias na precisão e eficiência podem ter grandes impactos na pesquisa astronômica avançada.
A ferramenta desenvolvida pela equipe está disponível em código aberto, permitindo que pesquisadores de todo o mundo a acessem e a integrem livremente em seus trabalhos. Os resultados da pesquisa de Alexander serão publicados no Monthly Notices da Royal Astronomical Society.
“Atualmente, estamos disponibilizando esta ferramenta para especialistas em astronomia, acreditando que ela pode ser um recurso valioso para levantamentos celestes, permitindo a obtenção de dados mais realistas”, afirmou Alexander.