A ideia de retroceder e alterar o passado é um tema recorrente na ficção científica, mas, na realidade, parece estar além de nossas possibilidades.
No entanto, um trio de pesquisadores, composto por David Arvidsson-Shukur, Aidan McConnell e Nicole Yunger Halpern, propôs uma abordagem intrigante que, embora não permita a verdadeira viagem no tempo, possibilita simulações em sistemas quânticos, abrindo portas para avanços significativos na metrologia quântica.
Em seu artigo publicado na Physical Review Letters, os pesquisadores apresentam uma proposta inovadora baseada na manipulação do emaranhamento quântico. O emaranhamento é um fenômeno quântico no qual duas partículas ficam interligadas de tal maneira que o estado de uma não pode ser definido independentemente da outra.
Ao explorar essa propriedade, Arvidsson-Shukur, McConnell e Yunger Halpern sugerem uma configuração experimental na qual informações podem ser “enviadas de volta no tempo” para alterar retroativamente as ações do experimentalista, gerando medições ideais.
A simulação de viagem no tempo proposta pelos pesquisadores envolve o uso de estados emaranhados, fundamental para as versões mecânicas quânticas já propostas e experimentalmente simuladas.
"O teletransporte quântico desempenha um papel crucial nesse contexto, permitindo que um estado da etapa intermediária do experimento seja efetivamente enviado de volta ao início. Essa abordagem não apenas explora as nuances da mecânica quântica, mas também sugere vantagens físicas que são inatingíveis em sistemas puramente clássicos.
Embora a realidade de uma viagem física ao passado seja hipotética, foram propostas e experimentalmente simuladas versões mecânicas quânticas desse conceito. Um elemento crucial nesses experimentos é o fenômeno de teletransporte, no qual um estado na fase intermediária do experimento é efetivamente transmitido de volta ao ponto inicial.
Para que isso ocorra, é necessário que os estados estejam emaranhados, ou seja, compartilhem uma conexão quântica especial que se forma entre duas (ou mais) partículas. Isso implica que o estado de uma partícula não pode ser determinado de forma independente do estado da(s) outra(s).
Ao se apoiarem na mecânica quântica, tais simulações de viagem no tempo possibilitam que os pesquisadores abordem questões fundamentais sobre a natureza dos sistemas quânticos e explorem eventuais benefícios associados.
No âmbito desse novo estudo, Arvidsson-Shukur, McConnell e Yunger Halpern se dedicam precisamente a essa tarefa, investigando as potenciais vantagens que as simulações de viagem no tempo podem oferecer à metrologia quântica. Este campo da física utiliza os princípios da mecânica quântica para realizar medições de extrema precisão.
O que é metrologia quântica?
Um desafio comum na metrologia quântica envolve a estimativa de parâmetros desconhecidos em um sistema ou processo utilizando sondas mecânicas quânticas. Após a preparação das sondas e sua interação com o sistema, a transformação do estado das sondas codifica informações cruciais sobre o parâmetro desconhecido. O objetivo é extrair o máximo de informações possível de cada sonda.
A aplicação da medição pós-seletiva emerge como uma estratégia valiosa nesse contexto. Nesse procedimento, o experimentador realiza uma medição e, com base no resultado obtido, decide incluir ou excluir determinados resultados experimentais da análise. Essa abordagem direcionada concentra as informações adquiridas por cada sonda.
Anteriormente, Arvidsson-Shukur, Yunger Halpern e seus colaboradores demonstraram que, em um sistema quântico, a escolha de um estado de sonda de entrada ideal pode proporcionar ao experimentador a obtenção de mais informações por sonda do que seria possível no contexto clássico.
No entanto, geralmente, o experimentador só descobre qual teria sido o estado de entrada ideal após a ocorrência da interação. Em um cenário desprovido de viagem no tempo, essa limitação representa uma complicação significativa.
No entanto, ao realizar o teletransporte do estado de entrada ideal através da manipulação de emaranhamento, o trio evidencia que isso poderia resultar em novas vantagens operacionais para o experimentalista.
Em sua proposta, o experimentador inicia preparando um par de bits quânticos, conhecidos como qubits, chamados A e C, que estão maximamente emaranhados, além de um qubit adicional utilizado como sonda. O objetivo é mensurar a intensidade de uma interação desconhecida por meio dessa sonda.
Inicialmente, o experimentalista não possui conhecimento sobre o estado de entrada ideal para o qubit A. Na primeira etapa, a sonda interage com o qubit A, codificando informações sobre o parâmetro desconhecido da interação em seu estado.
Em um estágio intermediário, no entanto, o experimentalista realiza uma medição no estado do qubit A, revelando informações sobre o estado ideal ainda não conhecido.
Em seguida, o experimentalista utiliza essas informações para preparar um qubit auxiliar, denominado D, nesse estado ideal. Posteriormente, ele efetua uma medição no estado conjunto dos qubits C e D. Se esse estado conjunto não corresponder ao estado conjunto inicial de A e C, a medição é excluída da análise.
Isso efetivamente seleciona os casos nos quais o estado D, preparado de maneira ideal, se teletransporta para o estado original do qubit A. O processo de teletransporte implica que, ao medir a sonda, o experimentalista registra um ganho ideal de informações, mesmo que inicialmente não tenha preparado a sonda no estado ideal.
- Veja também: O emaranhamento quântico e a topologia estão ligados
Durante o experimento, o pesquisador descarta muitas medições que não correspondem ao sucesso do teletransporte. Embora isso possa parecer dispendioso, as medições retidas pelo pesquisador – aquelas em que o teletransporte é eficaz – proporcionam um substancial ganho de informações por sonda. No geral, os dados obtidos com algumas sondas ideais superam as perdas quando agregados ao longo de diversas tentativas.
A viabilidade física da viagem no tempo ainda é tema de debate. No entanto, os pesquisadores têm a capacidade de utilizar a mecânica quântica para simular a viagem no tempo no ambiente laboratorial, aprimorando assim a precisão das medições realizadas.
Como Arvidsson-Shukur, McConnell e Yunger Halpern concluem em seu artigo, “embora as simulações [de viagem no tempo] não permitam que você volte e altere seu passado, elas permitem que você crie um amanhã melhor ao resolver os problemas de ontem hoje”.