Textos medievais deteriorados raramente provocam extenso debate online, no entanto, o Manuscrito Voynich, cuja natureza é extremamente peculiar e hermética, constitui uma exceção.
O referido texto, redigido em uma linguagem até então indecifrável, tem suscitado intrigas entre acadêmicos, criptógrafos e entusiastas amadores ao longo de séculos.
No ano passado, um considerável alvoroço foi gerado em torno de um artigo publicado no Times Literary Supplement pelo historiador e escritor de televisão Nicholas Gibbs, no qual afirmava ter desvendado o mistério do Manuscrito Voynich.
Gibbs propôs a teoria de que a escrita enigmática consistia em um guia de saúde voltado para o público feminino, em que cada caractere representava uma abreviação do latim medieval. Inicialmente, seu trabalho foi amplamente elogiado após a descoberta de duas linhas do texto.
Entretanto, lamentavelmente, especialistas e entusiastas logo identificaram falhas na teoria proposta por Gibbs. Lisa Fagin Davis, diretora da Academia Medieval da América, em entrevista a Sarah Zhang, do periódico The Atlantic, destacou que a decodificação apresentada por Gibbs carecia de coerência.
"A interpretação mais recente acerca do conteúdo e origem do Manuscrito Voynich pode não ser absolutamente precisa, porém tampouco é a mais absurda.
O manuscrito em questão tem sido atribuído, por alguns, à autoria de antigos mexicanos, Leonardo da Vinci e até mesmo a seres extraterrestres. Há aqueles que afirmam que o livro é um compêndio sobre a natureza, enquanto outros o consideram uma elaborada fraude.
Afinal, por que o Manuscrito Voynich tem se revelado tão intrincado e divisivo ao longo dos anos? A seguir, apresentaremos as principais informações que se deve conhecer a respeito desta obra.
A obra está estruturada em quatro seções de natureza altamente peculiar.
Michael LaPointe, em seu artigo na Paris Review, relata que o livro inicia com uma seção dedicada às ervas. Nessa parte, são apresentadas representações coloridas de plantas, cuja identificação ainda está sendo objeto de investigação.
A seção subsequente trata da astrologia e exibe imagens desdobráveis de mapas estelares que aparentemente se destinam a se ajustar a um calendário estabelecido.
As rodas astrológicas presentes nessas páginas são adornadas com pequenas ilustrações de mulheres nuas e, na seção seguinte, voltada à balneologia, os desenhos de teor erótico se intensificam. São retratadas imagens de mulheres nuas imersas em um líquido verde, sendo impulsionadas por jatos de água e segurando arco-íris com as mãos.
Determinados estudiosos sustentam a interpretação de que uma ilustração retrata um par de ovários com a representação de duas mulheres nuas suspensas em seu interior. Por fim, o manuscrito apresenta uma seção dedicada à explanação do funcionamento das substâncias entorpecentes.
Essa parte é composta por mais desenhos de plantas, seguidos por páginas escritas na enigmática linguagem presente no manuscrito, conhecida como Voynichês.
Os primeiros detentores do manuscrito também buscavam auxílio para compreendê-lo.
Davis relata em seu blog, intitulado Manuscript Road Trip, que a primeira aparição documentada do Manuscrito Voynich remonta ao final do século XVI. Rudolph II da Alemanha adquiriu o livro por 600 ducados de ouro, acreditando que o mesmo teria sido escrito por Roger Bacon, renomado cientista inglês que viveu no século XIV.
Posteriormente, um alquimista de Praga chamado Georgius Barschius obteve posse do manuscrito, referindo-se a ele como “um enigma da Esfinge que apenas ocupava espaço”. Johannes Marcus Marci, genro de Barschius, herdou o manuscrito após o falecimento de seu sogro.
Marci então encaminhou a obra a um especialista em hieróglifos egípcios, localizado em Roma, com o intuito de obter auxílio na decifração do conteúdo textual.
O manuscrito permaneceu desaparecido por cerca de 250 anos até ser adquirido, em 1912, por um livreiro polonês chamado Wilfrid Voynich. Voynich não revelou a identidade do proprietário anterior do manuscrito, o que gerou especulações de que ele próprio fosse o autor.
No entanto, após o falecimento de Voynich, sua esposa afirmou que ele adquiriu o livro no Colégio Jesuíta de Frascati, situado nas proximidades de Roma.
Alguns dos mais renomados criptologistas do mundo empreenderam esforços para decifrar o texto, porém sem êxito.
Sadie Dingfelder, do Washington Post, relata que William Friedman, um criptologista pioneiro responsável por decifrar os códigos do Japão durante a Segunda Guerra Mundial, dedicou anos de estudo na tentativa de desvendar o conteúdo do manuscrito Voynich.
Por sua vez, LaPointe, da Paris Review, concluiu que o manuscrito representava uma “tentativa primordial de construir uma linguagem artificial ou universal de natureza a priori”.
Embora a origem do Voynich seja desconhecida, essa perspectiva não parece ser infundada. Em 2014, pesquisadores brasileiros utilizaram um método avançado de modelagem de redes para demonstrar que os padrões linguísticos presentes no texto assemelham-se aos de idiomas conhecidos.
No entanto, até o momento, esses pesquisadores não lograram êxito na tradução do livro.
A análise de datação por carbono revelou que o manuscrito Voynich foi confeccionado no século XV.
Os testes conduzidos em 2009 revelaram que o pergaminho utilizado na confecção do manuscrito foi provavelmente produzido entre os anos de 1404 e 1438. Esses resultados, de acordo com Davis, descartam várias possibilidades quanto aos potenciais autores do manuscrito.
Por exemplo, o cientista inglês Roger Bacon faleceu em 1292, o que o impossibilita de ter sido o autor. Da mesma forma, Leonardo da Vinci só veio ao mundo em 1452, muito após a provável data de criação do intrigante livro. Além disso, Voynich nasceu muito tempo depois da concepção do manuscrito em questão.
O manuscrito encontra-se disponível online, permitindo o acesso para consulta a qualquer momento desejado.
O manuscrito em questão encontra-se atualmente sob a custódia da Biblioteca Beinecke de Livros Raros e Manuscritos da Universidade de Yale. A fim de garantir sua segurança, o manuscrito é mantido em um cofre.
Para aqueles que desejam adentrar o intrigante universo do Voynich, é possível encontrar uma cópia digital completa disponível ao fim deste artigo. Contudo, é importante ressaltar que a exploração das profundezas do enigmático Voynich pode ser uma jornada longa e complexa.
Abaixo encontrasse o Manuscrito Voynich